Há grades em minha janela


Minha janela tem grades. É uma constatação óbvia, que surgiu no momento em que me deitei na cama e olhei pela luz que penetrava pelo quarto, dissolvendo os resquícios de escuridão. Não que eu seja um observador atento, meticuloso, que perde os momentos com o olhar fixado numa imagem, a decompô-la em diversos sentidos. Foi apenas uma observação boba, mas que me deixou estranho, por entender que não deveria haver grades em minha janela.

Aquela forma quadriculada, soldada em ferro, impede-me de ver o horizonte sem riscos. Ele sempre surge manchado pelas formas forjadas em metal, tal qual uma ferida, que macula o olhar. Grades que existem para barrar um possível invasor, um sequestrador de nossa calmaria. É a promessa de segurança, mas uma segurança que limita a visão. E, tal qual um pássaro preso em uma gaiola, torno-me refém dos medos, enquanto me protejo por detrás de grades, frágeis grades, mas que passam aquela sensação de segurança.

Pergunto-me: deveria ser assim? Que liberdade é essa onde devemos colocar grades nas janelas, restringir nossa contemplação do horizonte para tentar buscar segurança? Não entendo a que ponto chegamos. Preocupações, medos, fobias, uma ansiedade de viver em segurança e, ao mesmo tempo, preso em nossos casulos, com medo da violência. Para contemplar o céu, as grades. Para termos segurança, os metais mais vis sustentam a sensação de proteção.

Nunca vivi o tempo em que as portas ficavam destrancadas à noite. Isso faz parte de lendas contatadas por pessoas mais velhas, histórias distantes, que não fazem parte do meu dia-a-dia. Não que aquela sociedade era melhor, superior. É a mesma sociedade de hoje. Só que, atualmente, há uma parafernália midiática tão intensa, uma diferença de renda ainda maior e uma sensação de vazio interior cada vez mais acentuada pelos progressos tecnológicos. Somos reféns dos nossos medos, das nossas dores, das nossas grades. Pergunto-me: para onde posso dar o próximo passo sem me importar com um possível furto do meu bem-estar?

Nessa sociedade de câmeras espalhadas aos sete ventos, com um sistema Big Brother espiando todos os cantos, com armas letais, cercas elétricas e toda parafernália de segurança, ainda tenho em minha janela uma grade. Não deveria estar ali, pois sufoca a visão de um mundo sem restrições. Mas existe, para oferecer a falsa imagem de que me protege. E assim caminhamos: cambaleantes e com grades a sufocar nossos passos...

Juliano Schiavo, 23 anos, é assessor de imprensa, escritor e estudante de ciências biológicas
Contato: jssjuliano@yahoo.com.br

Comentários

  1. Concordo contigo. Nunca acreditei plenamente na liberdade, acho ela um utopia. http://somenterascunhos.blogspot.com/2011/06/liberdade-uma-utopia.html

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